O regresso ao trabalho é um ritual moderno, quase sempre acompanhado por um mal-estar difuso. Não é dor, não é tristeza, mas é uma espécie de desleixo, entre o que somos e o que temos de ser. Durante dias fomos apenas nós, sem reuniões, sem e-mails, sem metas. Agora, voltamos a vestir o papel, a entrar no compasso diário, a medir cada dia em tarefas e prazos.
Assim, a chamada síndroma do regresso das férias é aquele murro invisível que atinge cada um logo na primeira segunda-feira depois de voltar. Durante uns dias vivemos como se o tempo fosse elástico, porque se dorme até mais tarde, esquece-se o despertador, come-se devagar, fica-se a ver o pôr-do-sol como se fosse a coisa mais importante do mundo.
De repente, num piscar de olhos, voltamos ao despertador, ao trânsito, às filas do supermercado e aos e-mails que parecem multiplicar-se sozinhos. Não é tanto preguiça, é mais uma espécie de choque cultural, porque se sai de um ritmo lento e tranquilo e atirados de volta para a correria de sempre.
É normal sentir um aperto no estômago, uma certa nostalgia das manhãs sem pressa. A verdade é que esta “síndroma” também nos deixa uma lição escondida. Se custa tanto voltar, talvez seja porque o nosso dia-a-dia está demasiado cheio, demasiado rápido, demasiado exigente.
Dizem que quem está aposentado vive em férias permanentes. Mas há algo de curioso que acontece quando chega ao mês de setembro, ou seja, mesmo sem horários, sem chefes, sem reuniões, há uma espécie de fim simbólico das férias.
Talvez seja o regresso dos netos à escola, o trânsito que volta a encher as ruas, os cafés que perdem o ritmo lento do verão. O reformado, ainda que livre do relógio, sente no ar que algo mudou. O verão, com os seus dias longos e despreocupados, vai-se embora. E com ele, aquela sensação de que o mundo inteiro está em pausa.
Agora, os dias continuam livres, sim, mas já não são tão leves. Há uma melancolia suave que se instala, como quem se despede de uma estação que nos deu mais do que sol, deu-nos tempo partilhado, conversas demoradas, memórias novas.
E talvez seja isso que distingue as férias do reformado, não é a ausência de trabalho, mas a presença de tempo com significado. Porque, no fundo, férias não são apenas descanso, são momentos em que a vida se vive com mais intenção.
Como tal, todos nós talvez precisemos de encontrar pequenos momentos para abrandar, como uma cerveja sem pressa, uma caminhada ao fim da tarde, um jantar em que se fala sem olhar para o relógio.
No fundo, o problema não é retomar o trabalho. É regressar a uma rotina que não nos deixa respirar. E talvez seja isso que o pós-férias nos vem lembrar que precisamos de trazer um bocadinho de férias para dentro do ano inteiro.
Depois das férias de verão, a “síndroma” do regresso ao trabalho raramente se prende apenas com a ideia de voltar às tarefas profissionais. O que se torna mais difícil é reencontrar uma rotina que, tantas vezes, se revela pesada, repetitiva e pouco generosa com o tempo pessoal. As férias funcionam como uma pausa, um espaço de respiro em que o relógio deixa de mandar tanto e em que recuperamos a leveza de estar.
É por isso que o pós-férias nos deixa esta espécie de desconforto, não é a labuta em si que custa, mas a sensação de que a vida quotidiana não oferece espaço para aquilo que, nas férias, descobrimos ser essencial que é o descanso, a convivência, o tempo livre, a atenção ao que realmente importa.
Talvez o verdadeiro desafio não esteja tanto em suportar o regresso, mas em aprender a trazer fragmentos desse espírito de férias para o dia a dia.
Seja através de pequenos rituais de pausa, de momentos de lazer bem guardados ou de uma nova relação com o tempo, o importante é que o trabalho não nos roube o ar. Assim, o regresso ao trabalho pode deixar de ser um corte abrupto e passar a ser uma continuidade mais equilibrada entre dever e prazer.
DÉCOUVREZ LE PORTUGAL ET LA COMMUNAUTÉ AVEC NOTRE JOURNAL