As Presidenciais

Em pleno alinhamento dos candidatos à presidência da república, para as eleições do próximo 18 de janeiro, verifico com alguma tristeza a falta de qualidade da mensagem dos candidatos. À exceção de alguns pouquíssimos momentos que passam desapercebidos dos portugueses – muita culpa aqui dos órgãos de comunicação social – verifico que os candidatos se debruçam sobre assuntos que não pertencem ao âmbito das funções de um presidente.


É com tristeza que verifico esta confusão de papéis – mas também com espanto pela insistência na passagem de mensagens descabidas por parte dos candidatos – pelo que julgo importante que os portugueses se debrucem sobre como a Constituição Portuguesa estabelece as funções de um presidente da república, começando por determinar a presidência da república como um órgão de soberania (art. 110º, al. 1). A partir do artigo 120º até ao 149º, temos os artigos que definem o estatuto, as competências, a eleição, o mandato e as responsabilidades do Presidente. Pela leitura desses artigos, em particular do 132º ao 140º, apercebemo-nos que o presidente não tem função executiva, estando essa atribuída ao governo e assembleia. Aqui começam dois problemas com algumas propostas, ou promessas – palavra que pessoalmente detesto no campo político – dos candidatos.

O primeiro problema é passar a ideia que se vai implementar um programa eleitoral em áreas como a saúde ou a educação. É um erro, é uma fantasia, é uma ilusão que se implanta nos eleitores. Isto está completamente fora dos estatutos do presidente e das suas responsabilidades. Nenhum candidato pode dizer que vai fazer isto ou aquilo, ou pior, impor algo ao executivo governativo ou à assembleia. Pelo artigo 110º, o governo e assembleia, assim como os tribunais, são órgãos de soberania a par com o presidente. As relações entre estes estão estabelecidas na constituição, não sendo um regime presidencialista, como por exemplo o francês. Nenhum candidato pode prometer que vai trabalhar para acabar as listas de espera da saúde, ou resolver os problemas da educação, ou a imigração – estão simplesmente fora da sua responsabilidade. O presidente tem sim uma importância como comandante supremo das forças armadas assim como algum papel nos negócios estrangeiros. No âmbito nacional, pode e deve ser uma força que crie uma visão para onde o país deve caminhar.


O segundo problema é a partidarização de muitos dos candidatos, com a pretensão de poluir a presidência com obsessões ideológicas e quezílias partidárias que são completamente despropositadas e inúteis ao país. É com desagrado e preocupação que vejo candidatos que pretendem, se forem eleitos, usar o cargo como um contrapoder ao executivo governativo ou mesmo à assembleia da república, também eleitos pelos cidadãos. Afirmações como não empossar governos liderados por este ou aquele partido ou por esta ou aquela pessoa, abre precedentes perigosos que se podem refletir sobre eles mesmos. Esta miopia política, fruto de uma obsessão ideológica que consome as energias do país em atos irrefletidos e estéreis, ultrapassa toda e qualquer racionalidade, assim como o estado de vergonha que deveria assistir candidatos ao mais alto cargo da nação. Não é difícil encontrar na História da Humanidade inúmeras situações em que impérios, nações, sociedades e até comunidades se afundaram na destruição autofágica pela corrupção das suas próprias instituições.


O presidente que Portugal precisa é um presidente que olhe para o mundo e que diga, face a face aos portugueses sem medos ou ofensas, que há outros países que fazem melhor em determinadas áreas, e como tal, criar o debate e consequente ação de como poderemos imitar ou desenvolver ainda melhor sobre o que os outros já desenvolveram. Portugal precisa de um presidente que não tenha receio de dizer aos portugueses qual a sua visão – e não falo aqui de discursos do género dos concursos de beleza, que seja específico, que promova a discussão independente e alargada que promova as melhores energias do país e os melhores talentos a participar ativamente nessa mudança. Portugal precisa de um presidente que não tenha receio de dizer aos portugueses que não existem recursos para tudo: aumentos extraordinários de pensões, hospitais, escolas e creches a cada esquina, salários milionários para todos e tudo gratuito! Portugal precisa de um presidente que saiba manter a elevação, mesmo quando à sua volta chafurdam na indecência, na falta de decoro, na irracionalidade, na infantilidade, no sensacionalismo ou na simplificação mistificante dos problemas.


Esta é uma lista incompleta, mas se ao menos os cidadãos exigissem esta curta e incompleta lista depois de compreenderem o que a Constituição determina para um presidente, estou certo que seria um passo, entre os muitos necessários, para um Portugal melhor.

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